corda aos vitorinos
dobradiças
dar de frosques
quilhar
lavar roupa suja
laurear a pevide
perder o pio
vergar a mola
mandar bitaites
uma surbia
vai no batalha
Memória descritiva
Eis um relato do quotidiano do Bonfim, onde o limiar que separa o turismo da vida familiar e comercial é muito ténue.
Uma fotografia, tal como o som, tem uma conotação de tempo e de duração implícita. Esta narrativa visual mostra o tempo captado pelos sons absorvidos.
Ao circular pela freguesia encontramos vestígios duma, outrora, zona industrial, dos antigos operários e das ruínas fabris. As habitações e os seus conceitos surgiram muito desta atividade económica e da necessidade de aproximar geograficamente uma classe média-baixa ao seu local de trabalho.
O contraste das ruas denota-se, atualmente, entre os luxuosos e antigos palacetes, inspirados noutras culturas arquitetónicas da época, as estruturas para pequenos comércios e serviços, os novos lares, bem como a reabilitação dos edifícios – chamemos-lhes, sem grande crítica, constantes empreendimentos.
Porém, o Bonfim é sobre pessoas. A ligação humana com as formas da arquitetura, as luzes, a história. As rugas da mudança e do crescimento, ao longo dos anos, são visíveis no património antigo que recupera a memória e a tentativa de modernização do mesmo. É vasto o dinamismo nas ruas, nas casas, no comércio, adverso à calmaria de um ou outro canto deste pedaço de Porto.
Ao falar-se desta atividade e agitação, instintivamente temos uma imagem mental sonora de um burburinho, um ruído citadino e a ação da presença humana num meio. Foi a querer descobrir esses sons e a dar-lhes uma visão que saí às ruas entre a Campanhã, o 24 de Agosto, o Marquês e a Fernão Magalhães. Os sons recolhidos marcam texturas temporais, de momentos ordenados e desordenados que transcrevem a vida daquele lugar.
O ruído expande-se no tempo, perpetuando tal situação num espaço e, da mesma forma, suspende-se, pairando como moléculas sonoras no ar.
Desacelera.
Fica mais grave e coloca-nos em movimentos mais lentos do que na realidade são. Desse jogo imaginário surgem imagens parcialmente suspensas num instante. Desaceleradas.
É um caos sereno, retratado em exposições ligeiramente alongadas, que acompanham o movimento da terra, das pessoas, da vida e do barulho.
As fotografias não surgem como uma transcrição desse “ruído”, mas como um complemento mútuo, baseado na sensação de movimento e agitação mas também de silêncio estático.
É um lugar real, sem grandes utopias, com sol e chuva, o que acarreta um significado diferente no diário dos sons e imagens. Quis que assim se mantivesse – autêntico – e agarrei-o numa chuvosa tarde de novembro. Os azuis não me deixam mentir: nas brisas mais frescas; nas poças de água dos baixos-relevos das ruas; nos brilhos polidos pelas chuvas. O distanciamento azulado ejeta-me para fora da tela, onde estou de passagem, caminhando em uníssono com as oscilações ruidosas dos locais e dos transeuntes.
Num enredo de vozes, gestos, trajetórias, culturas, classes sociais e histórias pessoais, encontra-se uma ligação envolvente da essência entre o que vemos e o que ouvimos.
PROJETO,
MESTRADO EM DESIGN DA IMAGEM, FACULDADE DE BELAS ARTES
DA UNIVERSIDADE DO PORTO
BONFIM, NOVEMBRO 2022